Foi debaixo de um sol seco, mas intenso, que chegamos a capital
do Estado do Texas apos uma longa viagem de autocarro, que incluiu uma escala
em Houston de 5 horas. Aqui, desaceleramos novamente o passo, nao tanto pelo
cansaco fisico (que ja comecava a ser algum), mas pelo calor abrasador que se
fazia sentir em Austin.
Apos resolvidas as dificuldades iniciais que nos fizeram
mudar tres vezes de hostel nos tres primeiros dias, fixamo-nos num hostel
fabuloso na margem do Lake Austin. Neste hostel, conhecemos varios americanos
que tinham deixado as suas cidades para tentar a sorte no Estado com a menor
taxa de desemprego dos EUA. O proprio hostel limitava a dez dias a estadia,
para que o mesmo nao ficasse lotado com a enorme quantidade de migrantes que
Austin alberga todos os anos.
O conjugar destas circunstancias economicas, com o nosso
desejo de conseguir algum dinheiro para alimentar esta viagem sem que cheguemos
a Portugal na bancarrota, instigou-nos a que tambem tentassemos a nossa sorte.
Apos uma ida ao Centro de Emprego local e uma tarde a responder a anuncios de
emprego no site Craigslist, o sucesso nao nos bafejou como desejavamos e o
melhor que conseguimos foi a consideracao em formato de email por parte de
dois empregadores. O facto de nao sermos cidadaos dos EUA era, a partida, um
grande handicap , assim como o facto
de os empregos ilegais nao serem suficientemente bem pagos para nos fazer ficar
em Austin a juntar dinheiro (e a cortar semanas de viagem). Provamos entao o
efeito destas medidas proteccionistas que tao elevadas taxas de empregabilidade
promovem no Texas. Tambem encontramos um site com ofertas de emprego em
ranchos, mas eram todos muito longe de Austin.
Austin e uma cidade que funciona bem! Com uma arquitetura
moderna e sem grande charme, a cidade encontra-se dividida em dois, por um bonito
lago que contribui para refrescar a cidade nos dias em que a temperatura
texana faz juz ao seu estigma de implacavel. De um lado do lago observamos um
tecido urbano composto por varias ruas geometricamente dispostas de forma
paralela e perpendicular, que denotam a tenra idade da sua construcao. Quem
reina nesta ruas e a 6th Street! Esta rua sobressai pela sua pulsacao rock 24
horas por dia, sete dias por semana. Em Austin, acabaram-se os blues e os jazz
que tinham vindo a marcar o ritmo nas ultimas semanas e a forca motriz desta
energia rock e sem duvida a hipermovimentada 6th Street. Repleta de clubes de
rock de ambos os lados, os concertos sao quase non-stop, embora com uma
incidencia maior em bandas de covers, em detrimento das bandas de originais. E
interessante verificar que nas cidades iconicas devido ao seu legado musical,
ha sempre uma rua que se destaca das demais, pela sua quantidade quase
exagerada de concertos. Foi
assim com a Broadway em Nashville, com a Beale Street em Memphis, com a
Frenchman Street em New Orleans e agora com a 6th Street em Austin.
No outro lado do lago, a paisagem urbana altera-se consideravelmente com as casas baixas e as lojas de decoracao bastante invulgar a servirem de
tonico. Fieis ao slogan nao oficial ‘keep Austin weird’ a zona de SoCo District
distingue-se das restantes pelas suas lojas vintage, pelos seus restaurantes e
botecos trendy e pelos seus clubes de Hard Rock (estes aqui, ja nao
aconselhaveis a meninos). Foi num destes clubes que vimos as lendas locais ‘Sons
of Hercules’ e ficamos sem palavras! Com uma potencia e um speed distribuidos
em doses perfeitas, esta banda mandou a casa abaixo com o seu vocalista a
transpirar aquela urgencia rock de antigamente, enquanto a restante banda cumpria,
muito competentemente, o seu papel. Se imaginarem o Mick Jagger com, dois
metros e cinco, mas com uma postura mais selvagem do que a de Iggy Pop, a vossa
projecao do que foi esta noite nao andaría muito longe da realidade.
Retenham este nome: ‘Sons of Hercules’. Se vierem a Austin, nao
percam um concerto desta banda. Com alguns parques para ver e com varios trails
a circundarem o lago, fizemos tambem varios passeios a pe bastante agradaveis.
Em Austin, fizemos tambem 3 buskings na rua do Capitolio, nas barbas da 6th Street, que nos renderam varias refeicoes e mais umas estorias para reter, entre as
quais o momento em que uma pessoa que tinha estado a ver-nos durante duas
musicas, foi presa a nossa frente ou o momento em que um puto se coloca ao meu
lado e cantou em dueto comigo o ‘get back’ dos Beatles! Nao podemos tambem
esquecer que, embora tivessemos menos pessoas a ver o nosso numero, os que nos davam
dinheiro, davam muito mais. (obrigado medidas ultraproteccionistas que tornam
esta gente rica).
Com uma ultima escala no Museu do Texas, para ficarmos com
um insight importante da sua historia, partimos para o Arizona, mais
concretamente, para a mitica paragem da route 66 em Flagstaff.
Chegamos numa madrugada a esta pequena cidade perdida no
meio dos canyons do Arizona e apanhamos boleia de um simpatico senhor que nos
contou logo importantes acontecimentos historicos que ocorreram em Flagstaff.
Nesta pequena cidade, que no inverno se transforma em estancia de neve,
aproveitamos para fazer hiking quase todos os dias. Subimos ao Monte Elden,
fomos ao Grand Canyon e infiltramo-nos no observatorio Lowell (local onde foi
descoberto Plutao e que ainda usa MS-DOS como sistema operativo). Entre
passeios campestres, ainda tivemos tempo para saber um pouco mais sobre o
sofrimento de quem tenta passar a fronteira dos EUA pelos desertos do sul do
Arizona, numa feira sobre sustentabilidade e responsabilidade social.
Despedimo-nos dos EUA com um busking e uma atuacao numa open
mic night. Num serao dominado pelos trovadores do sul da america, foi o Fado e
o Robert Johnson que arrancaram os maiores aplausos da noite.
De sorriso nos labios, eu e o Formiga carregamos as pesadas
mochilas durante tres kms e fomos para a estacao onde apanhamos o autocarro
para Tijuana, no norte do Mexico.
So long US! Tivemos muitas surpresas de norte a sul e temos
a certeza que voltaremos no futuro. Nao farei nenhum comentario, em jeito
conclusivo, sobre o país em si, pois nao sei por onde comecar, por onde pasar,
nem por onde acabar! Num país tao grande geograficamente, tao distinto culturalmente
e tao socialmente peculiar (a falta de melhor adjetivo), os EUA permanecem o
mesmo livro aberto do dia em que chegamos.
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